Dra Noélia Arruda

Sabia que a alimentação pode influenciar a fertilidade? “Está descrito na literatura que alimentos, superalimentos e nutrientes têm um impacto benéfico na qualidade dos óvulos e espermatozoides.” As palavras de Noélia Arruda, nutricionista, que nos fala da relação entre os dois mundos: infertilidade e alimentação.

É realmente possível que uma boa alimentação possa funcionar como uma solução para a infertilidade?

Sim. O pilar base de saúde é a alimentação.  Está descrito na literatura que alimentos, superalimentos e nutrientes têm um impacto benéfico na qualidade dos óvulos e espermatozoides. Por exemplo, o glúten, por si só, é um nutriente que provoca inflamação da parede intestinal e por consequência há uma reação do sistema imunitário na presença de alimentos com glúten. É por essa razão que a ausência do mesmo na alimentação melhora a fertilidade. Alimentos ricos em antioxidantes reduzem o stress oxidativo aquando da formação, maturação e diferenciação do ovulo que se pretende fecundar – assim, há uma melhor qualidade na membrana externa do ovulo que fica mais permeável á fusão com a membrana da cabeça do espermatozoide. Sabemos uma alimentação mais rica em carnes, produtos pré-confecionados e alimentos embalados/conservados, e por sua vez, uma ausência de alimentos coloridos (legumes, vegetais e frutas; frutos secos) torna naturalmente o organismo mais inflamado, o que gera reações de inflação generalizada, incluindo os óvulos que perdem qualidade. O excesso de peso ou a obesidade – que se refletem pelo excesso de gordura corporal – fisiologicamente gera inflamação, stress oxidativo e alterações hormonais que são um gatilho, em muitos casos, para óvulos de pior qualidade e menor quantidade. Estes são apenas alguns exemplos.

De que tipo de alimentação estamos a falar?

Os princípios básicos de uma alimentação devem estar, sempre, como o pilar base de qualquer alimentação saudável, equilibrada e variada. Contudo, a alimentação funcional vai um pouco mais além desses conceitos e promove uma variedade de alimentos que devem ser consumidos com maior regularidade e quantidade para superar doses diárias recomendadas de modo a satisfazer reserva de nutrientes essenciais para que o processo de maturação e fecundação do ovulo bem como a evolução ao estádio de blastocisto possa se desenvolver da melhor maneira. A alimentação funcional está integrada num olhar mais holístico para o ser humano, como um todo, para encontrar respostas ás verdadeiras causas da infertilidade – por exemplo uma alteração genética pode estar implicada numa alteração nas reservas de um determinado nutriente e isso terá impacto na fertilidade.

Acha que, de alguma maneira, as pessoas se vão virando para soluções alternativas? Ou ainda há muito ceticismo?

Existe um pouco de tudo, mas quem procura a nutrição já está informado para a importância da alimentação. Outras, procuram esta solução alternativa porque já fizeram inúmeros tratamentos (FIV) e não estão a ter sucesso, um pouco já na fase do desespero.

O que deveria mudar em Portugal?

Em primeiro lugar temos de mudar a mentalidade dos ginecologistas e médicos de família – que são as primeiras pessoas a quem um casal ou só a mulher recorre para perceber a causa da sua infertilidade. Em segundo, todos os profissionais de saúde devem unir-se para juntar conhecimento em prol dos nossos pacientes. Cada profissional é especialista e tem um conhecimento mais profundo sobre um determinado assunto que deve ser partilhado e aceite pela comunidade científica para obter respostas aos pacientes. Em terceiro lugar os próprios pacientes devem ter conhecimento sobre o seu estado de saúde:  devem ter acesso ás suas analises e exames e serem esclarecidos para que fiquem capacitados para tomar decisões conscientes.  Por exemplo, o caso de uma paciente de 32 anos teve 2 abortos no mesmo ano e o ginecologista refere que é por causa da idade. Neste caso, na minha opinião deve estudar-se o homem e a mulher, perceber as várias causas para acontecer um aborto. Podem existir diferentes motivos, pode ser por défices nutricionais desde o inicio da oogénese para formar os óvulos, das necessidades nutricionais acrescidas no momento da fecundação ou causas hormonais, entre outros fatores. Outro exemplo: um casal que já fez 5 FIV´s, sem sucesso – casos muito comuns nas minhas consultas – é importante que as clínicas de fertilidade investiguem casos de défices nutricionais que estão diretamente relacionados como a má qualidade dos óvulos e dos espermatozoides, algo que, muitas vezes, não acontece. Tenho muita sorte em trabalhar com uma ginecologista e um medico de fertilidade, porque defendo uma abordagem holística do tema, onde é importante trabalhar equipas multidisciplinares. Muitas vezes, preciso de comunicar com os médicos das minhas pacientes e nem sempre é fácil.

O que diz aos casais que a procuram?

Partilho sempre com o casal uma visão sobre a fertilidade que desconhecem do ponto de vista da nutrição funcional e holístico. É muito importante que os casais percebam o processo na sua magnitude para que vão fazendo as escolhas de forma consciente e responsável em prol dos objetivos determinados – principalmente em prol de uma gravidez natural.

São pessoas que vão um pouco com as alternativas esgotadas? Ou vão mesmo porque acreditam nesta abordagem?

Tenho recebido muitos casais que já tentaram 3 ou 4 ou 5 ou 6 ou mais FIV´s e não resultaram. ´É importante que os médicos ajudem os casais a encontrar outras estratégias. Se queremos resultados diferentes temos de mudar condutas repetidas até então.

Que diferenças faz esta abordagem em comparação com as outras, mais convencionais?

Nesta abordagem o foco é a natureza. E isso faz toda a diferença: foco na natureza ou foco na doença. Os suplementos alimentares para a fertilidade são nutrientes que o organismo humano tem, mas que, em casos específicos é necessário fazer um reforço para otimizar as funções do organismo para o desempenho que pretendemos. Por exemplo, a cafeína é um aditivo que estimula a adrenalina (hormona utilizada para a fuga ou ataque) e aumentar o nosso foco, a Q-10 permite melhorar a qualidade dos óvulos porque vai permitir ao nível celular aumentar o desempenho. Por sua vez, os medicamentos são substancia químicas que têm fases de absorção e distribuição para corrigir ou criar um mecanismo celular fora do ritmo metabólico normal – não necessariamente pôr o mecanismo a funcional por si só.

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